Sempre cantei em coração de pedra
de pedestal intocável.
Por muito tempo
usei camisa do avesso, calça rasgada e all-star.
Um dia usei roupão de seda e penteei o cabelo,
e nunca entendi porquê.
Pendurei meu coração no teto
para cantar melhor para minha vida.
De repente,
vejo meu coração
ir de pedra a porcelana
e por um fio
não cair ao chão.
Porcelana que tão mais bela que pedra,
tão mais frágil.
E enquanto o delicado balança,
apenas um sussurro se faz presente.
O da perigosa música que canto,
música que faz o belo
tão mais prezeroso que o bruto:
"Em delicadeza, o mundo pequeno fica
Mas cuidado enquanto o amor habita
Lágrimas quando transbordam coração,
Mil pedaços de porcelana ao chão"
Tentativas fúteis de controle de respiração.
Lá fora o mundo chove e aqui dentro o mundo acaba-se tão sutilmente quanto possível. As mãos tentam se mover, os dedos não encontram as teclas empoeiradas e a poesia já não existe mais.
Circunstâncias que insistem, surpreendem como mágica vulgar e amargam lábios, contraem músculos.
Os lábios estão secos e roxos, o inverno se foi.
Os sapos e as cotovias cantam como verdadeiros poetas.
Tudo o que tenho é tudo que me falta.
Tudo o que tenho me faz falta.
Tudo o que tenho é um lápis, uma folha de papel, algumas poucas palavras e a sabedoria infinitamente incompreendida. É meia garrafa de vodka tridestilada, meio maço de cigarros e uma camisa manchada e abarrotada. São cordas que dançam, notas que dançam e a música que - sentindo-se muito sozinha - resolve também dançar. Os muros infinitamente quadráticos e pastéis que se erguem e um dia que acaba mais cedo quando a motivação inabita a existência.
Tudo o que tenho não vale absolutamente nada.
Afeto. Indiferença. Vocabulário insuficiente. Faltam palavras.
E as perguntas realmente pertinentes. A meia garrafa de vodka está metade cheia ou metade vazia? Quantos anjos conseguem dançar na cabeça de um alfinete?
Tudo o que tenho.
Um fio de navalha tão cego que usaria óculos escuros se tivesse olhos e teria um cachorro-guia se tivesse de atravessar a rua.
Um plágio sincero que se faz presente.
Um poeta se dispersa e não há mais poesias.